
era no tempo em que às cinco da tarde corria para casa porque na mesa havia pão com doce para lanchar. no tempo em que me esperavas à janela e eu tardava na brincadeira dos baloiços e fingia não saber que as horas também passavam. e não sabia. na verdade não sabia nada de horas nem de compromissos, nem tão pouco compreendia a razão de não poder ficar infinitamente a balouçar. no tempo em que esperavas por mim na ombreira da porta com um ralhete para me dar! nesse tempo longínquo de joelhos esfolados e mãos sujas de terra verão, correrias e cabelos a pingar, verde à volta, verde e vento na bicicleta pasteleira. e havia sempre pão com doce para lanchar...doce que tu fazias para quando eu chegava, doce de tudo e com tudo, doce doce, doce no pão ou com bolachas, doce às colheradas, frasco de doce, dedo no frasco, dedos com doce, doce no meu imaginário. e lá fora, sempre a rodar, os brinquedos do parque mesmo em frente à janela do teu quarto, de onde guardavas o meu brincar.
se fechar os olhos, tenho-te na janela de pedra da casa por habitar. se fechar os olhos, cheiro a panela do teu doce e quase não me controlo e espeto dentro o indicador para provar. se fechar os olhos com muita força, e não consigo evitar, acordo a saudade imensa que te tenho e zango-me, de um zangar pequenino, por não voltares a ser na janela, nem eu caber no escorrega e no baloiço do parque fim de tarde.