Wednesday, April 4, 2007

pão com doce


era no tempo em que às cinco da tarde corria para casa porque na mesa havia pão com doce para lanchar. no tempo em que me esperavas à janela e eu tardava na brincadeira dos baloiços e fingia não saber que as horas também passavam. e não sabia. na verdade não sabia nada de horas nem de compromissos, nem tão pouco compreendia a razão de não poder ficar infinitamente a balouçar. no tempo em que esperavas por mim na ombreira da porta com um ralhete para me dar! nesse tempo longínquo de joelhos esfolados e mãos sujas de terra verão, correrias e cabelos a pingar, verde à volta, verde e vento na bicicleta pasteleira. e havia sempre pão com doce para lanchar...doce que tu fazias para quando eu chegava, doce de tudo e com tudo, doce doce, doce no pão ou com bolachas, doce às colheradas, frasco de doce, dedo no frasco, dedos com doce, doce no meu imaginário. e lá fora, sempre a rodar, os brinquedos do parque mesmo em frente à janela do teu quarto, de onde guardavas o meu brincar.
se fechar os olhos, tenho-te na janela de pedra da casa por habitar. se fechar os olhos, cheiro a panela do teu doce e quase não me controlo e espeto dentro o indicador para provar. se fechar os olhos com muita força, e não consigo evitar, acordo a saudade imensa que te tenho e zango-me, de um zangar pequenino, por não voltares a ser na janela, nem eu caber no escorrega e no baloiço do parque fim de tarde.

1 comment:

calola said...

Ficou-me uma profunda nostalgia. O saudoso passado, a felicidade (chamada, no meu mundo, marmelada, entre duas faces de uma carcaça!).Mas sinto, de alguma forma, que os baloiços, mesmo que não se movam ao meu peso, perduram na minha memória e, desta forma, ainda existem, ainda lá permaneço. Enquanto me lembrar, através de e mesmo com uma imensa saudade e maior nostalgia, consigo sentir o que era ser feliz, como no tempo em que lá cabia.
Obrigada pelas tuas palavras inspirad(or)as.
Calola